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quinta-feira, abril 25, 2024

Vozes da Bola: Nelinho, símbolo do Cruzeiro, conta em entrevista, a paixão pelo clube

Nascido em 26 de julho de 1950, dez dias depois do ‘Maracanazo’, no subúrbio do Méier, no Rio de Janeiro, um certo Manoel Rezende Matos Cabral, filho do casal de portugueses Seu Manoel e D. Rosa, virou Nelinho.

Nome diminutivo do pai, é bem verdade, mas que a carreira fez questão de demonstrar em gols, atuações e um chute potente, o contrário.

Nelinho, um dos maiores laterais do futebol brasileiro e que marcou 180 gols, é o camisa 2 que mais vezes estufou as redes adversárias na história do futebol mundial.

Você estava em seu último ano como aspirante do Fluminense em 1970, quando foi contratado pelo América-RJ. O que houve ali?

Joguei no Fluminense no infanto-juvenil e o Pinheiro era o treinador. Nessa época eu iria subir para o aspirante do Fluminense e receberia uma ajuda de custo. Mas, o América me procurou e me propôs pagar um salário mínimo da época. Então, quer dizer, eu disputei o aspirante pelo América, ou seja, o último ano de aspirante pelo clube. Depois disso, não teve mais no Rio de Janeiro campeonato de aspirantes.

Você era office-boy no Centro do Rio e saía todo dia de casa com marmita e tudo. Sua mãe só ficou sabendo que você estava no América/RJ quando seu chefe ligou para sua casa perguntando por você. Como foi essa história?

Eu estudava no Pedro II, na Tijuca, e repeti o segundo ano colegial duas vezes seguidas. Aí, minha mãe falou: “Você não quer estudar não? Então, você vai trabalhar!”, e arrumou um trabalho para mim no Centro do Rio de Janeiro, de office-boy, numa empresa, não sei se era americana, sei lá, chamada Arnico. Estava trabalhando nessa empresa quando recebi o convite, quando eu treinava no Fluminense escondido, em vez de ir trabalhar eu ia para o Fluminense. Então, nessa época, não estava no América, e sim no Fluminense, e aí o meu chefe ligou para minha mãe e falou assim: “Dona Rosa, o seu filho está doente? Por que doente?, respondeu ela. É que ele não tem vindo trabalhar! Como assim, se ele sai todo dia de casa com sua marmita para ir trabalhar? É mais não está vindo para cá não!”. Cheguei em casa depois de um treino e tive que explicar para ela que havia recebido um convite, que estava jogando futebol e que estava ganhando o mesmo que ganhava como office-boy. Ela me perguntou se era aquilo que eu queria para minha vida, eu respondi que sim e ela mandou eu ir com tudo. Aí saí do emprego e assumi a carreira no futebol.

No dia 19 de julho é comemorado o Dia Nacional do Futebol. O que o futebol representou para o Nelinho?

Representou tudo na minha vida. Se não fosse o futebol, eu nem sei o que teria sido na vida, que carreira escolheria seguir e como eu abandonei os estudos no segundo ano colegial, eu seria o quê? Não sei, só Deus sabe o que iria acontecer comigo. Mas, com certeza o futebol me salvou e fez com que eu, hoje em dia, tenha uma família estruturada. Hoje posso dizer que foi graças ao futebol que consegui tudo na vida e pude, a partir daí, montar minha academia e viver dela. Infelizmente o momento não é bom para as academias, mas espero que melhore.

Você sempre é lembrado como um dos grandes laterais direitos de todos os tempos do futebol brasileiro, ao lado de Djalma Santos, Carlos Alberto Torres e Leandro. Na sua opinião, quem foi o maior da posição?

É difícil responder essa pergunta, pois tivemos muitos bons laterais como o Cafú, Daniel Alves, Jorginho, Leandro, Djalma Santos, Carlos Alberto Torres. Mas para mim, que eu era fã, o melhor deles todos foi o Carlos Alberto Torres. Me espelhei muito nele e nas coisas que ele fazia dentro de campo. Mas o principal dele na minha opinião era que ele simplificava as jogadas, e em vez de dar dois toques na bola e passá-la para o companheiro, ele fazia isso com um toque só. E isso eu procurei fazer enquanto fui jogador profissional. Existem jogadores que dominam a bola e dão um, dois, três toques na bola para depois passar. E isso aí o Carlos Alberto Torres me ensinou a fazer diferente.

Você teve uma longa e bonita história no Cruzeiro, não foi?

Foi bonita porque eu era um reserva do Remo/PA e no Cruzeiro eu conquistei tudo que um jogador profissional poderia conquistar. Sou muito grato ao clube por me proporcionar isso. E se eu consegui meus objetivos foi porque o Cruzeiro era um senhor clube e contava com excelentes jogadores como Raul, Piazza, Dirceu Lopes, Zé Carlos, Palhinha, Joãozinho… enfim, qualquer um que chegasse ali para jogar naquele time ia ter uma facilidade maior. Mas o Cruzeiro foi muito importante para mim e sou eternamente grato por isso.

Apesar de carioca, você foi o jogador que mais atuou no Mineirão, com 348 jogos. Além disso, despontou no Cruzeiro e encerrou a carreira no Atlético Mineiro. Que balanço você faz da carreira?

Quando eu conto para meus familiares e amigos sobre a minha história no futebol, e principalmente, para os que estão começando a carreira, eles se assustam. Porque teve muitos percalços, foi fácil não! Profissionalmente eu comecei no América/RJ, fui para Portugal e voltei por não ter dado certo, quase desisti da carreira, fui para a Venezuela, onde joguei com alguns que jogaram comigo no América/RJ, por um tempo lavei meu material de treino, quer dizer, não tinha estrutura nenhuma. Depois reiniciei pelo Bonsucesso, passei no Remo/PA e finalmente cheguei ao Cruzeiro. A partir daí é que as coisas clarearam mas até eu chegar no clube mineiro foi muito sofrimento, viu? Então, às vezes os caras que comentam sobre determinado jogador, como se ele não jogasse nada, eles esquecem que o jogador está no time errado, no momento errado do clube e acaba não rendendo. Aí ele sai dali e joga bem em outro clube e eles ficam se perguntando: “Pô, como esse cara não jogava isso no clube que ele passou?”. É isso, às vezes você passa por um clube e não está bem ou o clube não vive uma fase boa, o jogador não consegue produzir. No meu caso foi isso, eu cheguei no Cruzeiro na hora certa e o time estava embalado, e eu joguei tudo o que sabia. Mas antes, não! Por quê? Porque os clubes por onde eu passei não tinham a estrutura que Cruzeiro tinha. E depois disso, quando fui para o Atlético/MG, foi quando o Cruzeiro estava sendo desmantelado, enquanto o Atlético/MG estava totalmente montado com Cerezo, Éder, Reinaldo, Luizinho… nossa, só grandes jogadores. Aí, facilitou para mim e consegui encerrar minha carreira em altíssimo nível, justamente porque eu caí em um clube bem estruturado como o Atlético/MG. Posso dizer que a minha carreira profissional, a partir da minha chegada aqui em Minas Gerais foi que deslanchou. Antes disso, só sofrimento. Mas não tenho o que reclamar não. Serviu para minha vida pessoal.

Qual foi o gol mais bonito que você fez na sua carreira?

Não foi apenas o mais bonito, como foi o mais importante: o gol contra a Itália na Copa do Mundo de 1978.

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