Certa vez, vi pela TV, um senhor com cabelos grisalhos e bem penteados, mascando chiclete, correndo ao lado dos jogadores no CT Ninho do Urubu.
Admito minha total ignorância, e confesso, de antemão, que não sabia que aquele senhor, não se tratava de um preparador físico como supunha, mas sim, era o novo treinador do Flamengo.
Era 20 de junho de 2019, quando Jorge Jesus começava a trabalhar no Flamengo.
Obsessivo por esquemas táticos a ponto de varar madrugadas assistindo jogos até da Segunda Divisão, Jorge Jesus levou essa obsessão para os treinos e jogos do Flamengo.
Se tornou chato a ponto de exigir que o jogador repetisse a mesma jogada uma dúzia de vezes.
“A filosofia dele é a mesma que vivenciei lá fora. A gente está se sentindo na Europa, mesmo estando aqui no Brasil. Muita exigência, cobrança e perfeccionismo por parte dele”, diria Diego Ribas com menos de trinta dias de convivência com o Mister.
Nesse quesito, às vezes lembrava um outro chato chamado Telê Santana (1931-2006), anos atrás.
“Ele cobrava perfeição em tudo. De dez bolas chutadas a gol, se o cara acertasse nove e uma fosse na trave ele chamava a atenção do jogador”, disse certa vez Zico numa entrevista.
O agora ex-treinador do Flamengo e atualmente no Benfica de Portugal, sempre foi fã da seleção brasileira de 1982, admirador do talento de Zico e discípulo do lendário jogador e técnico Johan Cruyff, morto em 2016.
Com tantas referências no universo da bola, criou seu próprio ‘carrossel’ no Flamengo, um time que jogava para a frente e nunca ficava parado, a exemplo do que fazia a seleção da Holanda de 74.
O português nascido em Amadora, dá enorme importância às questões táticas e técnicas, mas não se preocupa no relacionamento com os jogadores.
Não é paizão como Telê foi, que mandava o jogador comprar logo um apartamento como fez com o pentacampeão Denilson, quando assinou seu primeiro contrato.
Para Jesus, se o atleta vai para ‘nigth’, bebe todas e tem várias amantes, isso não é problema dele, porém, dá broncas homéricas nos treinos e à beira do campo, gesticulando os braços longos e arregalando os olhos como se estivesse regendo uma orquestra, puxa as orelhas de seus comandados.
Dentro de campo era com ele, fora, com os jogadores.
Jesus buscou o som perfeito de seus músicos nesses treze meses, que – com exceção de Diego Alves – produziram som com os pés.
Dos pés que conquistaram 28 vitórias, 6 empates e 4 derrotas, totalizando 90 pontos e deram mais um Brasileiro para o Rubro-Negro.
Na Libertadores, Jesus e seu Flamengo enfrentaram a LDU e o Peñarol na fase de grupos, o Internacional (quartas de final), o Grêmio (semifinal) e o River Plate (final). Apenas os uruguaios não foram vencidos pelo rubro-negro (0-1 no Maracanã, 0-0 em Montevidéu), mas o empate sem gols na sexta rodada eliminou o clube ainda na primeira fase.
O título, de forma emocionante, com um 2 a 1 de virada contra o River Plate-ARG a menos de cinco minutos do fim da partida, veio depois de 38 anos, e coroou a campanha de 7 vitórias, 3 empates e 3 derrotas.
O marido de Dona Ivone ganhou ainda a Supercopa do Brasil, a Recopa Sul-Americana, a Taça Guanabara e o Campeonato Carioca de 2020, este o mais insosso dos seis títulos conquistados.
Nesta tarde da última segunda-feira (20), no Ninho do Urubu, na Zona Oeste do Rio se reuniu com os jogadores e fez sua despedida à la brasileira, com churrasco e pagode.
Foi para sua terra natal deixando títulos, recordes e uma maneira diferente de jogar futebol.
E nos deixa a seguinte reflexão: Jesus foi importante para o Flamengo ou o Flamengo foi importante para Jesus?